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Violência doméstica: pequenos atos de controle já devem servir de alerta
Notícia publicada por Assessoria de Imprensa em 13/03/2019 12:52

O homem pede que a mulher com quem se relaciona troque um vestido que considera curto, mude a maquiagem que considerou exagerada ou altere o corte de cabelo para um mais discreto. Visto pela mulher, muitas vezes, como gestos de afeto, esses comportamentos já podem ser um indício de uma relação de violência doméstica que está começando a surgir. O alerta é da psicóloga Elaine Cordeiro, que atende mulheres vítimas desse tipo de crime no 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital, no Centro do Rio.

- São pequenos atos de controle sobre a mulher. Para ela, parece cuidado, mas, para ele, já é controle. Xingamentos, agressões físicas e pedidos de desculpas já são sinais de um ciclo promovendo uma cultura de continuidade da violência - explica.

Elaine acrescenta que é difícil definir o perfil do agressor:

- Atendemos diferentes níveis de escolaridade e classe social. Muitas vezes, o homem passa a ser violento por ciúme, pela posse da figura feminina ou tem histórico de agressão na família e naturaliza a situação, afirmou.

A psicóloga também alertou sobre o ciclo da violência doméstica, em que o violador pode mostrar episódios de arrependimento de forma regular, o que promove episódios periódicos em que a mulher é tratada mal, mas, tempos depois, é bem tratada e, assim, sucessivamente.

Ausência de denúncia dificulta combate ao crime

A ausência de denúncia em casos de violência doméstica é uma das dificuldades no combate a esse tipo de crime. A psicóloga Renata Monteiro da Silva, que atua desde 2013 no 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Capital, explica que as mulheres são as principais vítimas de ações contra a integridade física ou moral e que diversos fatores dificultam a denúncia por parte da vítima. O medo do agressor é um dos mais frequentes:

 - Ela é ameaçada. E, quando tem filhos envolvidos, aumenta ainda mais o medo de como isso vai repercutir. A falta de informação também dificulta o alcance desta vítima à ajuda, disse.

Renata explica ainda que, além de deixar de denunciar buscando defender outras pessoas da casa contra os mesmos atos, a ausência de registro se dá ainda por vergonha:

- Outro complicador é o fato de a vítima se achar responsável pelos atos de violência e entender que merece ser tratada dessa forma, explica.

A psicóloga destaca que um problema comum e recorrente atinge as vítimas que moram em comunidades:

- Uma das dificuldades é o direito às medidas protetivas de urgência, já que o Oficial de Justiça tem dificuldade de acessar a comunidade, muitas vezes marcada como área de risco. Isso inibe a área de proteção para essa mulher. Uma alternativa é a abordagem por meio da rede de atendimento, para que a vítima não precise passar pela delegacia ou pelo Judiciário para receber apoio e empoderamento.

Um caso que marcou a psicóloga foi o de violência sexual cometida pelo pai contra uma criança de sete anos. A mãe conseguiu medidas protetivas por meio do Projeto Violeta, que garante segurança e proteção máxima às vítimas de violência doméstica com maior celeridade. Na prática, a sua aplicação reduz o tempo entre a agressão e a decisão do juiz sobre a medida protetiva para a mulher, evitando a ocorrência do feminicídio – o assassinato feminino por questões de gênero.

As medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha protegem a integridade física e psicológica das mulheres e das famílias em casos de denúncia de violência. Uma das medidas mais comuns é a ordem de afastamento do agressor, que pode incluir também a proibição de qualquer tipo de contato, mesmo por telefone ou aplicativos de mensagem.

Em 2018, a justiça fluminense recebeu 108.959 novos casos de violência doméstica. Apenas em janeiro deste ano, já foram registradas 9.757 ocorrências em todo o estado.

MPM/SP