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Busca às origens: projeto propicia aproximação entre família biológica e filhos adotados
Notícia publicada por Assessoria de Imprensa em 29/06/2023 18:43

Quem não conhece uma família que adotou uma criança há muitos anos e que não revelou ao filho adotivo que houve a adoção? A prática, que era comum, normalmente devia-se ao pensamento de que a criança poderia sofrer algum tipo de preconceito social, se sentir rejeitada ou mesmo pelo medo de que ela viesse a futuramente querer procurar a família biológica e, com isso, acabar gerando algum conflito. Atualmente, no entanto, estudos na área de Psicologia apontam que o segredo sobre a adoção é que pode gerar danos emocionais ao adotado. Inclusive, o que nem todos sabem é que o direito a conhecer suas origens está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). 


Segundo o art. 48 do ECA, “O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos”. Ainda de acordo com a legislação, o acesso ao processo de adoção poderá ser também deferido ao adotado menor de dezoito anos, a seu pedido, assegurada orientação e assistência jurídica e psicológica.  


O direito a conhecer suas origens está previsto entre os direitos humanos, ligado ao direito fundamental de identidade, que faz parte do princípio da dignidade da pessoa humana. E envolve não apenas saber da adoção, mas da sua própria história, com aspectos genéticos, socioculturais e existenciais. E isso não quer dizer que a adoção não foi bem-sucedida: cada um reage de uma forma e tem necessidades distintas no sentido de querer ou precisar saber mais a fundo sua própria trajetória, o que deve ser encarado sem julgamentos, como algo que faz parte do processo.  


Neste segmento, será realizado nesta sexta-feira (30/6) o seminário gratuito O que Mudou no Direito ao Acesso às Origens?, a partir das 14h30, na sala multiuso do Museu da Justiça do Rio, localizado na Rua Dom Manuel, 29, Centro.  


A abertura do evento será feita às 14h30 pela coordenadora da Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional (Cejai), desembargadora Ana Maria Pereira de Oliveira; pela juíza titular da 1ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital e membro da Coordenadoria Judiciária de Articulação das Varas da Infância e Juventude e Idoso (Cevij), Lysia Maria da Rocha Mesquita; e pela psicóloga da 1ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso Erika Piedade da Silva Santos.  


Em seguida, das 15h às 17h30, serão apresentados os seguintes temas: 
Origens: uma busca de múltiplos caminhos, com a antropóloga Claudia Fonseca; 

Apresentação do Adotiva Brasil, com a jornalista e bacharel em Direito Larissa Alves, que é filha adotiva; 

A Questão do Filho na Busca às Origens, com a psicóloga do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec) Patrícia Glicério Pinho; 

O Atendimento às Pessoas que Buscam Suas Origens, com a assistente social do Serviço de Apoio Técnico aos Órgãos Colegiados com atribuição afeta à Infância, Juventude e Idoso (Seiju) Betania Nunes Carvalho e a psicóloga do Seiju Maria das Graças dos Santos Duarte.  

Atuarão como mediadoras a psicóloga do Seiju Eliana Olinda Alves e a assistente social do Núcleo de Estudo e Aperfeiçoamento Interdisciplinar Luciene Rocha.  


De onde eu vim? 


Essa curiosidade sobre suas origens levou Isabella, de 37 anos, que hoje mora na França, a procurar pela sua mãe biológica. Noemia da Conceição viu neste contato a realização de um grande sonho acalentado por anos. “Pedia todos os dias a Deus para reencontrar minha filha”, contou a empregada doméstica que hoje mora em uma colônia de pescadores na Ilha do Governador. 


A decisão de entregar sua primeira filha para adoção foi um ato de amor. O ano era 1985. Noemia se viu repentinamente grávida do homem por quem era apaixonada e que virou as costas para ela e a criança que esperava ao saber da gravidez. Com o abandono, a jovem procurou o apoio da família e também não encontrou. Na época, com 18 anos e morando em Pernambuco, trabalhava em situação análoga à escravidão e não podia nem contar com a ajuda de seus patrões para sustentar a filha. O desespero foi tanto que chegou a pensar em tirar a própria vida. Mas resolveu seguir adiante. “Foi uma dinâmica muito difícil, só quem passou sabe. Era o filho do homem que eu amava no meu ventre”, contou.  

  
“Eu tinha que tomar uma decisão, salvar minha filha da miséria em que eu vivia, da escravidão de alguma forma, para ela sobreviver, se alimentar. Foi a decisão mais difícil de toda a minha vida. Ali eu senti que eu morri, que eu não ia sobreviver. O pior foi tomar essa decisão sozinha, sem ter com quem falar, desabafar. Nunca tive apoio de ninguém. Todos os caminhos se fecharam, nenhuma mão se estendeu”, relembrou emocionada.  

 
Mas Noemia não perdia a esperança de um dia poder reencontrar sua filha. “Eu tinha em mente que um dia eu teria notícias dela. Pedi a Deus todos os dias, toda hora, todas as noites. Isso era uma constante na minha mente e no meu coração. Não pedi nada além disso, só queria isso, para minha tranquilidade. E quando essa notícia chegou para mim eu só senti, não sei explicar. As portas do céu se abriram para mim, foi surreal. Ela me libertou, o fato de ela ter me procurado me libertou de um cárcere privado. Eu era muito trancada dentro de mim, eu não sorria com o coração, só mostrava os dentes. E, por dentro, não tinha felicidade, era muito triste, muito insegura, nunca me perdoei por isso. Sobre a vinda dela agora não encontro palavra para dizer a importância que isso tem na minha vida. Subi aos céus com vida”, disse ela, que aguarda ansiosamente a chegada do dia 24 de julho, para quando está marcado um grande encontro de Isabella com toda a família biológica.   


Dez anos depois, Noemia engravidou novamente e hoje tem uma filha, Luiza, advogada, que soube somente na pandemia pelo que a mãe tinha passado e que tinha uma irmã biológica. “Ela recebeu com espanto, ficou perplexa, mas adorou saber que tem uma irmã mais velha do que ela. As duas se falam muito, se comunicam muito e estão super felizes”, compartilhou, agradecendo ao projeto pela felicidade que vive agora. 

 
“A minha opinião é de que este projeto é divino. Quem criou o Busca às Origens foi inspirado por Deus, a mando dele, para formar essa equipe de anjos para massagear os corações pisoteados. Foi assim que me senti quando cheguei, uma massagem de carinho, de apoio, de compreensão porque meu coração era um papel amassado sem importância. Eu enxergo que aí tem anjos de verdade”, afirmou.    

 
Estatísticas 
 
Segundo dados do Tribunal de Justiça do Rio, foram finalizadas 19 adoções internacionais de 2019 a 2023, tendo ocorrido 28 pedidos ao projeto de Busca às Origens no período. Entre os países onde as crianças e jovens passaram a viver estão França, Israel, Estados Unidos, Suécia, Canadá, Suíça, Itália e Espanha.  
 
Já em relação às adoções nacionais, foram finalizadas 149 de 2021 a 2023, com 14 pedidos para conhecer as famílias biológicas.  

SP/FS