Evento debate como Corte Interamericana de Direitos Humanos orienta combate ao racismo
Compuseram a mesa a advogada Nina Barrouin; a mediadora Abab Nino e o advogado Rudá Oliveira
A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão judiciário da Organização dos Estados Americanos (OEA) responsável por interpretar a Convenção Americana e julgar violações cometidas pelos Estados-membros, foi o foco do evento “Análise Jurídica dos Crimes de Racismo no Brasil: um debate sobre as decisões da CIDH”.
Realizada nesta terça-feira, 25 de novembro, a atividade integrou o “Novembro Negro”, do Núcleo de Atenção e Promoção à Justiça Social (Napjus), reunindo especialistas para discutir como o sistema de Justiça brasileiro tem respondido aos crimes de racismo e de que forma as decisões da CIDH podem orientar práticas mais eficazes no enfrentamento ao racismo estrutural. O encontro foi mediado pela advogada e assistente do Napjus, Abab Nino.
O Brasil já foi condenado pela Corte em casos como Vladimir Herzog, Favela Nova Brasília, Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde e na tragédia da Fábrica de Fogos de Santo Antônio de Jesus, principal exemplo debatido no encontro. Em 1998, a explosão da fábrica clandestina baiana matou 64 trabalhadores, majoritariamente mulheres e crianças submetidas a condições perigosas e precárias.
Para aprofundar a discussão, o evento contou com a participação do advogado e mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio) Rudá Oliveira. Ao analisar de forma mais detalhada o desenrolar jurídico do caso, ele destacou que o objetivo central do debate é refletir sobre mudanças no âmbito nacional a partir do estudo do sistema internacional de direitos humanos.
“É importante compreender que não estamos debatendo o governo do momento, mas, sim, o funcionamento do Estado brasileiro. Isso vai além das variações e contradições que cada gestão pode gerar. Nosso objetivo é promover uma transformação estrutural do Estado. Para isso, precisamos reconhecer o contexto de violações sistemáticas presentes em suas práticas e, a partir do acionamento do sistema internacional, buscar mudanças no âmbito nacional”, afirmou Rudá.
A CIDH concluiu que, no caso da fábrica de fogos, o Estado brasileiro falhou na fiscalização, permitiu a continuidade da atividade ilegal e não investigou adequadamente o desastre, violando direitos fundamentais. Outro caso discutido foi o de Simone André Diniz, que, em 1997, respondeu a um anúncio que exigia uma “moça branca” para trabalho doméstico. Apesar da discriminação evidente, as autoridades arquivaram a denúncia sem investigação. A Comissão Interamericana reconheceu que o Brasil foi omisso e tolerou institucionalmente a discriminação racial.
Ao discutir como o sistema internacional de direitos humanos pode fortalecer o enfrentamento ao racismo estrutural no Brasil, a advogada do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) Nina Barrouin ressaltou a necessidade de ampliar a compreensão sobre o papel do Estado e sobre as dinâmicas que sustentam desigualdades históricas. Nesse sentido, afirmou:
“É essencial compreender a violação do direito à igualdade como um processo ativo, em diálogo com a luta histórica do movimento negro por ações afirmativas e com a responsabilidade do Estado de enfrentar o racismo estrutural. A discriminação não pode ser vista apenas como algo pontual ou interpessoal; uma leitura ampliada fortalece outras agendas de luta. Essa perspectiva é decisiva para mobilizar esses argumentos em casos no sistema interamericano e para interpretar essas situações no contexto brasileiro”, completou Nina.
VM/IA
Fotos: Brunno Dantas / TJRJ