Seminário debate desafios e perspectivas da segurança pública no Brasil e no RJ
Da esquerda para a direita, estão à mesa de abertura os desembargadores Flavio Marcelo Fernandes, Elton Leme e Luiz Marcio Pereira e a juíza Luciana Fiala de Siqueira Carvalho, membra do Cedes
“A segurança pública é o tema mais importante da atualidade no Brasil porque o crime chegou a um ponto em que virou uma verdadeira epidemia”. Foi com esse apontamento que o diretor-geral do Centro de Estudos e Debates (Cedes) do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Elton Martinez Carvalho Leme, abriu o seminário Desafios e Perspectivas Atuais da Segurança Pública. Iniciado nesta quinta-feira, dia 2 de outubro, o encontro promovido pelo Cedes juntou operadores do Direito e do Legislativo para debater a expansão do crime no país. A palestra foi realizada no Auditório Desembargador José Navega Cretton, no Fórum Central, e transmitida ao vivo pela plataforma Teams.
Cenário da segurança pública no Brasil
“A questão da segurança e do crime chegaram a um nível que impede o desenvolvimento. Não é mais somente nos grandes centros urbanos em que ele está presente. O crime também se expandiu para o interior, para as áreas remotas do nosso país. O fato é que a pequena corrupção cria alicerce para a instalação da grande corrupção à medida em que passamos a viver e admitir esses pequenos ilícitos, criando uma cultura de flexibilização dos princípios e da aplicação da lei”, considerou o desembargador Elton Leme ao falar sobre o atual cenário da segurança pública no Brasil.
De acordo com o estudo Governo Criminal na América Latina: Prevalência e Correlatos, desenvolvido pela Cambridge University Press, cerca de 26% da população brasileira vive atualmente sob domínio de um governo paralelo.
“Há 1/4 da população vivendo sob um governo criminoso, entre 50 e 60 milhões de brasileiros. Nesses territórios, o crime organizado domina, e o Estado não tem mais poder para entrar. São, portanto, lugares que deixaram de ‘ser’ Brasil porque o país está perdendo a soberania sobre uma parte relevante do próprio território. Disso vem a necessidade de tratar das lacunas da legislação e da jurisprudência para pensar em soluções inteligentes de enfrentamento”, pontuou o diretor da área de Direito do Crime Organizado e da Segurança Pública do Cedes, desembargador Flavio Marcelo de Azevedo Horta Fernandes.
Na mesa de abertura, o codiretor da área de Direito do Crime Organizado e da Segurança Pública do Cedes, desembargador Luiz Marcio Victor Alves Pereira, compartilhou um episódio em que uma colega juíza, empossada recentemente, perguntou para ele como é a segurança pública em Macaé, na Região Norte Fluminense. A resposta foi desfavorável à segurança.
Crescimento do crime organizado no Rio
Mas, afinal, como a violência, mais presente em grandes cidades, se espalhou para espaços distantes, no interior e litoral do Estado?
Na primeira mesa do seminário, o secretário de Polícia Civil do Rio de Janeiro, delegado Felipe Lobato Curi, apontou uma das ações que teria causado a pulverização do crime organizado. “Em 2008, a Polícia Militar, sem um estudo aprofundado ou apoio da Polícia Civil, tentou se estabelecer em comunidades por meio do projeto das Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs) na capital. Inicialmente, o projeto deu certo, mas se desvirtuou, e os traficantes que ocupavam a capital migraram para os outros municípios".
Sobre o impacto que organizações criminosas têm nos territórios e nas eleições, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ), desembargador Peterson Barroso Simão, afirmou: “a atuação desses grupos criminosos já reclamou a atuação da Justiça eleitoral em 2024, quando identificada a interferência deles no processo eleitoral. Em Belford Roxo, houve uma operação denominada 'teatro invisível', em que R$ 3 milhões foram encontrados, e o processo ainda está em fase de julgamento. Uma expressiva parcela do eleitorado também foi afetada pelas alterações nos lugares de votação, medida justificada pelo fato de estar sujeita às ações do crime organizado naqueles lugares".
O presidente do Fórum Permanente de Direito Penal da Escola da Magistratura do Estado Rio de Janeiro (Emerj), desembargador José Muiños Piñeiro Filho, também ressaltou o surgimento e a fragmentação das milícias no Rio de Janeiro e uma tipificação do crime ocorrida em 2012 pelo Senado Federal.
A Lei na realidade do Rio
De acordo com o desembargador Paulo Sérgio Rangel do Nascimento, que participou da segunda mesa ao lado do desembargador Flavio Marcelo Fernandes e do deputado federal Paulo Francisco Muniz Bilynskyj, é necessário que a legislação se adeque à realidade do Rio de Janeiro. “A legislação é o suficiente para nós convivermos bem. No entanto, o problema está na interpretação do Direito. Aspectos ideológicos e políticos passaram a fazer parte do Direito Penal, fazendo com que o viés normativo-jurídico se perdesse. É preciso adequar a legislação e a interpretação da legislação para a realidade singular do Rio de Janeiro”, disse.
O seminário continuará amanhã, dia 3 de setembro, a partir das 9h da manhã, no Auditório Desembargador José Navega Cretton. Clique aqui para se inscrever.
KB/MB
foto: Brunno Dantas/TJRJ