Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Continuação da audiência do caso Henry Borel será nos dias 14 e 15 de dezembro, determina juíza
A juíza Elizabeth Machado Louro, da 2ª Vara Criminal da Capital, designou a continuação da audiência de instrução e julgamento (AIJ) do processo que apura a morte do menino Henry Borel para os dias 14 e 15 de dezembro. A magistrada começou a ouvir nesta quarta-feira (6/10) as testemunhas de acusação do processo. A audiência durou mais de 14 horas.
Filho da professora Monique Medeiros e enteado do ex-vereador Jairo Souza dos Santos Júnior, o Dr. Jairinho, o garoto de quatro anos de idade morreu no dia 8 de março e, de acordo com a denúncia, foi vítima das torturas realizadas pelo padrasto no apartamento do casal, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio.
Trazida do presídio em Niterói, a professora acompanhou os depoimentos sentada no banco dos réus. Já o ex-vereador Jairo Souza dos Santos Júnior, o Dr. Jairinho, por medida de segurança, participou de forma remota por videoconferência a partir do Presídio Petrolino Werling de Oliveira, conhecido como Bangu 8.
Presos desde abril, eles foram denunciados pelo Ministério Público pela prática de homicídio qualificado (por motivo torpe, com recurso que dificultou a defesa da vítima e impingiu intenso sofrimento, além de ter sido praticado contra menor de 14 anos), tortura, coação de testemunha, fraude processual e falsidade ideológica.
Primeiro a ser ouvido de um total de 12 testemunhas de acusação arroladas, o delegado Edson Henrique Damasceno, responsável pela investigação, ratificou, num depoimento de quase quatro horas, as conclusões do inquérito. Segundo ele, o caso chegou à 16ª Delegacia de Polícia como acidente doméstico. Mais tarde, porém, o laudo do Instituto Médico Legal mostrou que Henry apresentava inúmeros sinais de agressão e a perícia constatou que o apartamento havia sido limpo.
Ainda segundo o delegado, ao prestarem depoimento nove dias depois do crime, Monique e Jairinho se mostraram tranquilos. As versões apresentadas pelo casal eram coerentes, mas o comportamento atípico com a situação chamou a atenção. “Ela tirou uma ‘selfie’, pediram pizza e até fizeram brincadeiras”, disse Henrique Damasceno. Na ocasião, a babá e a empregada também foram ouvidas e confirmaram a versão de que a relação na casa era harmoniosa.
As evidências do crime, no entanto, vieram a partir do primeiro laudo do telefone de Monique. Um print da conversa entre ela e a babá, no dia 12 de fevereiro, mostra um relato de uma agressão do então vereador ao menino enquanto a mãe estava em um salão de cabeleireiro. A babá foi novamente chamada a depor e confirmou a veracidade das mensagens. Ainda segundo os laudos juntados aos autos no curso da investigação, Henry sofreu 23 lesões por ação violenta no dia 8 de março.
“Ficou evidente que houve uma rotina de agressões ao menino e que, mesmo depois da morte, Monique apresentou uma versão absolutamente compatível com a de Dr. Jairinho. Ela soube da agressão e não fez nada, mentiu na delegacia e mentiu no hospital”, disse.
O depoimento do policial tomou toda a parte da manhã da audiência e, em determinado momento, gerou atrito entre o promotor Fábio Vieira e o advogado de Monique Medeiros, Thiago Minagé, obrigando a juíza a alertar as partes sobre a necessidade da manutenção do rito da audiência.
Dinâmica da audiência
Após intervalo e antes da retomada dos depoimentos, a juíza Elizabeth Machado Louro explicou em plenário que a dinâmica da audiência de instrução e julgamento dos acusados pela morte do menino Henry Borel é própria.
“Aqui a gente não pode deixar que as partes comecem a adiantar mérito e fazer encadeamento de provas. Aqui são só perguntas e respostas. O que não é a dinâmica de CPI e nem tem que ser”, destacou a magistrada.
O esclarecimento foi feito após um mal-entendido em relação a intervenção que fez para conter a discussão entre representantes da acusação e da defesa. O atrito interrompeu o depoimento de uma testemunha do caso. Ao preservar a autoridade sobre a audiência, a magistrada disse que a dinâmica ali não era de CPI e que não permitiria que a oitiva se transformasse em um circo.
“Acho que houve um mal-entendido. Sou uma entusiasta da CPI e respeito muito os parlamentares. Não tenho nenhuma razão para ofender qualquer membro da CPI. Acho que houve um mal-entendido. No calor de chamar a atenção das partes, eu não fui clara e acabei unindo um vocábulo ao outro”, disse.
Segunda testemunha a ser ouvida, a delegada auxiliar da 16ª DP Ana Carolina de Caldas afirmou que a ré Monique, mãe do menino, teria ciência da rotina de violência que Henry sofria e não o afastou desta situação, que tanto ela quanto seu namorado Jairinho, também réu na ação, mentiram no inquérito policial e que a criança já teria chegado morta ao hospital. Ela destacou ainda que as agressões a Henry teriam começado pelo menos a partir do dia 2 de fevereiro e que as reiteradas agressões físicas e psicológicas teriam ficado comprovadas, além de que a babá teria ocultado os fatos por ter sofrido ameaça velada.
Em seguida, foi a vez de o policial civil Rodrigo Melo, que participou das oitivas e diligências do caso, dar o seu depoimento. Ele afirmou que as câmeras de segurança verificadas mostraram que não houve nenhum tipo de acidente com Henry no período em que esteve com o pai em um shopping antes de ser entregue a Monique, reforçou que o laudo pericial demonstrou que o menino teve uma morte violenta e que, no dia do ocorrido, quando a perícia esteve no apartamento em que a criança foi morta, o imóvel já havia sido limpo.
Emocionado, pai de Henry Borel relembra em depoimento últimos momentos com menino
O pai da vítima, Leniel Borel de Almeida Júnior, relatou que mantinha um bom relacionamento com a ex-mulher até o surgimento de Jairinho e retratou seu filho como uma criança “maravilhosa, dócil, amorosa, o filho que toda mãe queria ter”. Afirmou que seus pais se separaram quando ele tinha a idade do Henry e que se preocupava em se manter presente na vida do filho. Ele contou ainda que, mais de uma vez, Henry teria relatado que o “tio”, como se referia a Jairinho, o teria machucado, mas que, ao questionar Monique sobre o assunto, ela sempre negou que o filho fosse vítima de maus tratos. “Toda vez que eu pegava meu filho, verificava se ele tinha alguma marca ou escoriação”, contou.
Leniel também relatou que Henry sempre demonstrava resistência em retornar à casa da mãe, comportamento que ele atribuía às mudanças recentes na vida do menino, como a separação, a alteração de endereço e a nova escola. Muito emocionado, Leniel chorou ao contar sobre o último registro de vídeo que fez do filho, cantando a música religiosa “Mãezinha do Céu”. Ele Lembrou que Henry ficou muito nervoso e vomitou na sua volta para casa no dia anterior à sua morte e que teria dito na frente de Monique que “mamãe não é mamãe boa”. “Foi a última vez que vi meu filho vivo”, lamentou, dizendo que só teve certeza de que teria se tratado de uma morte violenta após o laudo preliminar do Instituto Médico Legal (IML) de hemorragia interna por ação contundente.
O pai do menino relatou ainda ter sofrido ameaças indiretas que acredita ser por parte de Jairinho e que foi procurado por ex-companheiras dele que relataram que seus filhos também sofreram agressões do ex-vereador, assim como Henry. Disse que Monique era ambiciosa e que hoje ele faz tratamento psicológico e psiquiátrico e vive à base de remédios. “Meu filho estava sendo criado para fazer a diferença nessa sociedade. Poderia ser um novo Einstein, um criador de vacina”, afirmou, dizendo que a última vez em que falou com Monique foi no enterro do menino.
A ex-companheira de Jairinho, Ana Carolina Ferreira Neto, com quem o médico tem dois filhos, afirmou em depoimento que tem boa convivência com ele e se considera sua amiga. Disse ainda que o visita no presídio e que nunca ouviu falar de agressão dele a crianças. “Ele sempre foi melhor pai que marido. Meu problema com ele foi devido a traições”, destacou.
Outras testemunhas
Quinta testemunha a depor, Ana Carolina Ferreira Netto, ex-mulher de Jairinho, disse não ter conhecimento das agressões atribuídas a ele contra crianças.
Depois, o executivo do Instituto D’Or Pablo dos Santos Menezes contou que, no dia da morte do menino Henry, recebeu uma mensagem do então vereador Dr. Jairinho pedindo um favor no Barra D’Or. Quando retornou a ligação, foi informado pelo réu de que houve uma tragédia, o seu enteado havia morrido e que, como a mãe estava muito abalada, pediu agilidade na atestação do óbito no hospital. Pablo teria explicado que era impossível fazer a liberação do corpo e contou que ficou desconfortável com a insistência de Jairinho.
Em seguida, foi ouvida Thayná de Oliveira Ferreira que trabalhou durante quase um mês como babá do menino Henry. Ela pediu que Monique Medeiros não permanecesse no plenário durante o seu depoimento, e alegou que foi usada pela ré que falava “coisas ruins” sobre o ex-vereador. Thayná não confirmou ter conhecimento que o médico batia no enteado. “Eu não falei em nenhum momento de agressão porque eu não vi nenhuma agressão”, destacou. O promotor Fábio Vieira dos Santos pediu a extração de peças para a apuração do crime de falso testemunho que poderia estar sendo cometido pela babá.
Por fim, foram ouvidas as médicas do Barra D’Or Maria Cristina de Souza Azevedo, Viviane dos Santos Rosa e Fabiana Barreto Goulart Deleage que afirmaram que o menino chegou em parada cardiorrespiratória ao hospital, sem sinais vitais, e que foram feitas manobras de ressuscitação por mais de duas horas sem êxito.
Confira fotos da audiência (Fotos: Brunno Dantas/TJRJ)
AB/SP/MB/FS/FB